domingo, 3 de novembro de 2013

FanFic - Biology 2 Capítulo 6





(Niall Horan’s POV)


O pôr-do-sol banhava com gentileza a faixa de asfalto em meio à grama, uma fria brisa de fim de tarde encontrando seu caminho por entre os galhos das árvores e fazendo as folhas silvarem timidamente. 
Respirei fundo, absorvendo a paisagem solitária. O vento atingia meu rosto em golpes macios, entrando pela janela do carro como se tivesse medo de que eu o repelisse com minha indiferença. Meu coração batia forte, meu olhar perdido no horizonte deserto. Em poucas horas, eu estaria de volta à vida real, de volta a todos os problemas dos quais tentei escapar pelas últimas duas semanas. 
Eu não sabia se estava pronto para voltar. A cada vez que piscava, olhos azuis cheios de dúvida me encaravam no auge de sua inocência, mil perguntas colidindo em suas grandes íris. 
A palavra pai parecia estrangeira, nem um pouco familiar para ambos, por mais contraditório que isso soasse. O abraço, apesar de apertado, não fora íntimo; o sorriso, por sua vez, compensara a falta de um dente com a perfeita materialização de um sonho realizado, expandindo seus horizontes como nada antes fizera. 
O leve estrangulamento intensificou-se ao redor de meu pescoço, ainda que mal representasse ameaça à sólida sensação de tomar a atitude certa reinando em meu peito. Ali estava mais uma pessoa – ou um pequeno ser humano que mal podia esperar para que eu o ajudasse a se tornar uma – que esperava algo de mim. 
Pelos resquícios de integridade ainda presentes em mim, pedi para que aquele olhar esperançoso não fosse mais um dos muitos outros que manchei com decepção. 
Eu não sabia se estava pronto para voltar. Mas eu precisava voltar. 
Engoli em seco, apertando o volante e tentando me focar na estrada. Difícil. Minha mente divagava à medida em que me aproximava de minha última parada, minha última relação com o surreal, com o inexistente. Com o passado. 
Me perguntei se ainda doeria. Fazia tantos anos... Por mais que o tempo já tivesse cumprido seu dever e se encarregado de amenizar a dor, a cicatriz emocional sempre existiria, impedindo-me de esquecê-la, mesmo que já desbotada. 
Parei o carro rente à grama, levando comigo a singela rosa em meus dedos trêmulos ao caminhar por sobre o verde. Não olhei ao meu redor; eu já sabia que caminho seguir sem precisar me orientar. 
Meus pés desaceleraram ao me aproximar do granito antigo. O nó em meu peito, que a anatomia chamava de coração, apertou-se; tudo estava acontecendo exatamente como sempre. Quis rir de mim mesmo por pensar que algo mudaria. 
Ajoelhei-me de frente à lápide, meus dedos abandonando a rosa diante dela e percorrendo a fria superfície onde letras em dourado resistiam ao tempo, persistentes em sua função de representar a dor ali enterrada. 

Lucy Davies 
(17/02/1978-10/09/1991) 
Amada filha


Minha garganta se fechou ao fitar a foto sobre os dizeres. Não ousei encará-la por mais que dez segundos, as lembranças fluindo livremente por todo o meu corpo e me causando arrepios. 
Muito do que eu era podia ser explicado por elas. Eu me recordava de tudo, com tamanha intensidade que relembrá-las era como voltar no tempo. A culpa se enroscava ao redor de meu estômago como uma serpente, aniquilando-o em seu aperto e provocando náuseas. Em meio à tortura silenciosa sob a qual minha mente submetia meu corpo, fui capaz de pedir, mais uma vez, desejando mais do que tudo ouvir alguma resposta. 
- Me desculpe. 
Não seria diferente. O perdão nunca viria. 

Respirei fundo ao fechar a porta do carro, minha última missão pendente antes de regressar à vida que eu planejava consertar cumprida. Esfreguei os olhos, afastando as incertezas que ainda os assombravam, e mantive-os baixos por alguns segundos. 
Um brilho prateado em meu pescoço atraiu minha atenção, e instintivamente meus dedos se fecharam ao redor do pequeno pingente sob minha blusa. O presente sempre encontrava uma maneira de se fazer notar. 
Duas semanas. E enfim, seus olhos corroídos pelo desapontamento haviam perfurado a última barreira que protegia meus raros sonhos. 
Afinal, não se pode sonhar se não se dorme, certo? 
Relembrando como minha vida era poucos dias atrás, duvidei da teoria. Sonhos podiam sim acontecer mesmo de olhos abertos. 
Pesadelos não eram exceção, aprendi mais tarde; a dor era igualmente ou talvez ainda mais real que a alegria. 
Me perguntei se tudo havia sido um devaneio. Talvez se eu me esforçasse para despertar de meu transe, acordaria em minha cama, atrasado para dar aulas. Nos encontraríamos nos corredores por uma coincidência muito bem arquitetada, e eu lhe sopraria algumas palavras infames para me divertir com a irritação em seus olhos. Com alguma resposta inteligentíssima ardendo em meu rosto como um tapa, eu olharia por cima de meu ombro para vê-la fugir de mim, e gravaria sua imagem para me fazer companhia mais tarde, nas noites em que o sono me faltasse e não houvesse outro alguém para realizar a função de minha mão. 
Sim... Tudo aquilo me parecia muito mais crível que a decepcionante versão que minha mente insistia em considerar verdadeira, e da qual eu já não podia mais fugir. 
Eu a havia conquistado; ela havia sido minha, porque realmente quisera ser. Pela primeira vez em muito tempo, eu sentia. Meu coração batia, meus olhos viam, minhas mãos tocavam. Mas sem que eu pudesse fazer qualquer coisa, ela havia me deixado. E então, eu deixei de sentir. Meu coração ainda batia, meus olhos ainda viam e minhas mãos ainda tocavam; porém, nada era como antes. Parecia não haver nada para ser bombeado a não ser o remorso, nada para ser visto a não ser o cinza, nada para ser tocado a não ser o frio. 
Novamente, eu estava sozinho. Mas a solidão se mostrava muito mais hostil depois que me permiti conhecer a felicidade, como se guardasse rancor do tempo em que lhe fui desleal. Uma lição que eu aprendia pela segunda vez: não se entregue a ninguém, não deseje ninguém; uma vez feita a troca, corre-se o risco de, na pior das hipóteses, perder ambos. 
Acontece que as piores hipóteses tinham um fraco por mim. 
Demorei a perceber que havia voltado a dirigir, perdido em pensamentos; horas haviam se passado, porque já estava em Londres. Felizmente, consegui completar o trajeto sem me envolver em acidentes ou infringir leis de trânsito, apesar de minha mente estar bem longe da estrada. Reforcei a atenção nos últimos minutos do caminho, dirigindo com toda a concentração que pude reunir, até estacionar na garagem de meu prédio. 
Lar, doce lar. 
Refreei meu pensamento. O que me esperava a alguns metros de altura? Nada além de paredes frias, escuro e vazio. 
A palavra lar e a sensação de conforto que trazia consigo parecia alienígena em meio à imagem que surgiu em minha cabeça. Algo estava faltando, algo essencial; desejei com todas as minhas forças que todo o resto desaparecesse se este fosse o preço para recuperar o que havia perdido. Mas como eu já havia aprendido muito bem, quando o assunto era (S/N), não havia muito que o dinheiro pudesse fazer. 
Relutante, peguei minha mala e subi para meu andar, encontrando-o exatamente como previra. Nada estava fora do lugar, o que teria sido um tanto incomum para meus padrões se eu já não soubesse que ela fazia questão de deixar tudo em perfeito estado antes de ir embora, como se fosse responsável por cada centímetro de bagunça. 
Quem eu estava tentando enganar? Eu não duraria dois dias sem ela. Não ali, onde tudo ainda tinha seu cheiro e parecia acostumado à luz e ao calor de um relacionamento feliz. 
Abandonei a mala em algum lugar e de imediato preparei um drinque, necessitando do ardor do álcool em minha garganta para me distrair mesmo que minimamente. Fitei o nada, deixando meu corpo cair sobre o sofá. 
Agora que a solidão havia realmente me engolido, não consegui evitar que antigas recordações me fizessem companhia; um homem nunca estaria realmente só enquanto ainda guardasse suas lembranças, ainda que no lugar mais longínquo possível de sua mente. 

Flashback – vinte anos atrás 

Fechei os olhos, deixando que as correntes do balanço onde estava sentado me acalentassem em meio ao calor da tarde. Eu estava chateado; meus primos não ficariam para aquelas férias de verão. Tinham acabado de partir para a casa de veraneio dos pais, e devido às minhas recentes notas insatisfatórias, mamãe havia me proibido de ir junto. 
Maldita matemática. 
Com as pontas dos pés tocando o chão, impulsionei-me, ganhando altitude cada vez mais depressa. Ameacei sorrir, gostando da pequena aventura, até que com um estalo vindo da estrutura de metal, encontrei o chão. 
Caí sobre meu braço, tentando em vão proteger o rosto do impacto com a terra. Meu nariz formigou, inundando meus olhos fechados, e mais que depressa me sentei, esperando me recompor o mais depressa possível do vergonhoso ocorrido. Senti meu joelho arder, e notei um corte na pele que aos poucos começava a sangrar. 
Nada estava dando certo naquele início de férias. Fechei a cara, preparado para me levantar e marchar até meu quarto para não sair de lá tão cedo, quando algo chamou minha atenção. 
- Espera! 
Sobressaltei-me ao ouvir a voz desconhecida e inesperada, e olhei em sua direção. Uma garota pulava a cerca que separava nosso jardim da casa vizinha, e correndo até mim, cobriu delicadamente meu machucado com um Band-Aid colorido. 
- Pronto – ela sorriu, parecendo satisfeita com seu socorro. Ainda envergonhado e assustado com sua presença, levei algum tempo para responder. 
- Obrigado – gaguejei, piscando várias vezes para mascarar as lágrimas que haviam se acumulado ali. Ela riu baixo. 
- De nada. Quem é você? 
Lancei-lhe um olhar inseguro. 
- Niall – respondi simplesmente. 
- Niall de quê? 
- Horan. 
A garota sorriu e estendeu uma mão em minha direção. 
- Sou Lucy. Lucy Davies. Tenho treze anos. E você? 
- Onze – falei apenas, ainda intimidado, e percebendo que ela insistia no cumprimento, levei minha mão até a dela num rápido aperto. 
Um belo erro. 
- Ai! – choraminguei, trazendo meu braço para perto do corpo num reflexo. A dor em meu pulso derrotou qualquer tentativa de combater o choro, que veio em poucos segundos. 
Não demorou muito para que minha mãe viesse até mim, confusa, e de olhos fechados, ouvi a tal Lucy contar o que havia acontecido. Mamãe me ajudou a ficar de pé, e em pouco tempo estávamos no hospital, onde um médico engessava meu punho quebrado. Dois meses imobilizado. 
Definitivamente, nada estava dando certo. 
Voltei para casa em menos de uma hora, cabisbaixo e conformado com o tédio que me acompanharia pelas próximas semanas. Para melhorar meu humor, mamãe dissera algo sobre me ajudar a estudar matemática, já que não haveria mais nada para fazer. Ótimo. 
Depois do jantar, sentei-me nos degraus da varanda, cutucando o gesso sobre meu colo, com cuidado para não doer. Não fiquei sozinho por muito tempo. 
- Oi. 
Eu a havia visto se aproximar dessa vez, poupando-me do susto. Forcei um sorriso. 
- Oi. 
- Está doendo? – Lucy murmurou, com o olhar fixo em meu braço; neguei com a cabeça – Me desculpe por ter apertado sua mão. Eu não sabia. 
- Tudo bem, não foi sua culpa – falei, dando de ombros e indicando meu joelho – Obrigado pelo Band-Aid. O médico teve que colocar outro no lugar depois de limpar o corte. 
- Tudo bem, eu tenho outros – ela repetiu, mexendo numa pequena bolsa de lã pendurada em seu ombro transversalmente – De que cor você gosta? 
- Azul – respondi, esperando até que ela encontrasse o curativo certo, e franzi a testa ao ver que ela havia pegado dois iguais. 
- Pronto – Lucy disse, colocando um deles sobre meu gesso e estendendo o outro a mim – Pode ficar com esse. 
- Obrigado – sorri, dessa vez genuinamente, guardando o presente em meu bolso – Eu nunca tinha visto Band-Aids coloridos que nem os seus. 
- É porque só eu tenho – ela riu baixo, lisonjeada – Eles só são coloridos porque eu uso canetinha neles. 
Ergui as sobrancelhas, surpreso. 
- Mesmo? 
- Mesmo. 
Observei a pequena tira azul sobre o branco do gesso. A pergunta que eu estava acanhado demais para fazer saiu de sua boca. 
- Quer colorir Band-Aids comigo? 
Voltei a encará-la, minha resposta nítida em meu sorriso. 
A partir desse dia, Lucy fora oficialmente incluída em minhas restritas brincadeiras. Eu não podia correr, mas descobri que havia muito a ser feito para me divertir sem que meu braço fosse comprometido. Perdi a conta de quantos quebra-cabeças montamos naquelas férias, de quantas horas passamos lendo gibis e fingindo sermos super-heróis, de quantas competições de quem ficava mais tempo sem piscar ou respirar fizemos, de quantas histórias de terror ela havia me contado para me deixar com medo de dormir sozinho à noite... De certa forma, Lucy havia me acolhido como um irmão caçula. Sempre que eu conseguia melhorar nas lições de matemática que mamãe me dava, ela colocava mais um Band-Aid colorido em meu gesso, agora cheio de desenhos que havíamos feito juntos. Sempre que eu me irritava por perder em uma brincadeira, ela me fazia cócegas e em cinco minutos eu já me esquecia da derrota. 
- Sabe... Meu irmão bem que podia ser como você. 
Desviei os olhos da centopéia que cambaleava sobre o parapeito da varanda de sua casa. 
- Irmão? – Franzi a testa, tentando me lembrar de alguma menção anterior. – Pensei que você era filha única como eu. 
- E eu sou – ela sorriu, erguendo os olhos até mim – Mas se um dia eu tiver um irmão, quero que seja assim que nem você. 
Sorri de volta, empolgado. 
- E se um dia eu tiver uma irmã, quero que seja como você. 
Lucy cerrou os olhos, como sempre fazia ao ter uma idéia. 
- Quer ser meu irmão? 
Pisquei duas vezes. 
- Isso é possível? 
- Claro que é. Basta a gente querer. 
- Então eu quero. 
- Tá, agora me pergunta de volta. 
- Você quer ser minha irmã? 
- Quero! 
Sorrimos um para o outro. Eu tinha uma irmã agora! E ainda por cima mais velha, o que era sempre mais legal. Ela cuidaria de mim e me ajudaria com a lição de casa quando as aulas voltassem, o que aconteceria dali a uma semana. 
Eu e meus primos voltamos à escola; Lucy, não. 
Durante todo o caminho de volta, tentei pensar em possíveis motivos para justificar sua ausência. Todos eles simplesmente sumiram ao avistar minha casa. 
E o monte de cinzas bem ao seu lado. 
- Lucy! – gritei, largando minha mochila no meio do caminho e correndo na direção do que restava da casa dos Davies, sendo barrado por um bombeiro antes mesmo de pisar no jardim. Minha mãe surgiu na mesma hora, puxando-me para perto de casa com choque no rosto, e eu não consegui parar de chamar por ela, me debatendo para me livrar dos braços firmes que me prendiam no lugar. Lágrimas inundavam meus olhos desesperados, e eu mal percebia o que acontecia ao meu redor a não ser o trabalho dos bombeiros. Eu precisava saber onde ela estava, eu precisava vê-la... 
- Querido, você precisa se acalmar – minha mãe implorou, apertando-me contra seu corpo e me carregando para dentro de casa. Tentei me libertar, em vão. 
- Eu preciso ir até lá! Ela precisa de ajuda! – eu gritei o mais alto que pude, soluçando sob o olhar torturado de minha mãe – Você não entende? Ela precisa de mim! 
Vi lágrimas se formarem em seus olhos, e seu silêncio aos poucos se tornou ensurdecedor, a verdade muda infiltrando-se em meus ouvidos. 
- Não... Não, mãe, não – murmurei, as palavras deixando minha garganta com dificuldade – Diz alguma coisa, por favor, diz... 
Perdi completamente a força, enterrando o rosto em seu abraço ao permitir que o choro me engolisse. Gritei. Gritei muito. Chorei, mal conseguindo respirar. Fechei os olhos com força, lembrando-me dela, meu coração doendo mais do que nunca. 
Lucy tinha morrido. Minha irmã... Eu era filho único outra vez. 
Meus olhos ardiam, inchados após horas de choro. Não estendi o braço para pegar o copo de água com açúcar que papai me dera. Não tive vontade. Apenas encarei o nada, lágrimas agora silenciosas escorrendo por meu rosto e que mamãe insistentemente enxugava, escondendo as suas ao máximo. 
Ela havia me ajudado tantas vezes... Desde a primeira vez em que nos falamos, quando fez um curativo em meu machucado, até a noite anterior, quando nos despedimos com sorrisos ansiosos pelo primeiro dia de aula que viria depois que ela me ajudara a consertar uma boneca de Emily que eu havia quebrado. 
Eu não estava lá quando ela precisou de ajuda. Quando, segundo o que ouvi os bombeiros dizerem a meus pais algum tempo depois, um curto-circuito no andar de baixo iniciou um incêndio que rapidamente se alastrou por toda a casa, que já era bastante antiga, deixando-a presa no quarto assim como seus pais. 
Eu não pude fazer nada para ajudá-la. Ela simplesmente morreu... Sozinha. 
Não fui ao enterro. Afinal, não havia nada para ser enterrado. Apenas uma lápide fora colocada, com uma foto do que um dia fora minha melhor amiga, e agora não passava de uma lembrança que muito em breve todos esqueceriam. 
Menos eu. 

Fim do flashback 

Nos mudamos daquela vizinhança em poucos meses, numa tentativa frustrada de meus pais de me tirar do escuro. Os olhos vazios e a incansável apatia me acompanharam, já parte de mim onde quer que eu fosse. 
Levei um ano para, aos poucos, despertar do entorpecente luto que caiu sobre mim e finalmente voltar a ser eu mesmo. 
Mas lá no fundo, eu sabia que muito havia mudado em meio à troca de pele pela qual passei... Como um enxerto que agora se confundia em meio a traços de minha personalidade, eternamente camuflado. 
Conforme os anos passaram, descobri que havia me tornado incapaz de algo muito humano: me entregar a alguém. Durante a adolescência, nunca me apaixonei. Nunca tive namoradas fixas, que durassem muito mais que um fim de semana ou dois. Na faculdade, apesar de despertar muitas paixões, nunca as retribuí inteiramente. Me sentia oco, impossibilitado de desenvolver pelos outros o que eles desenvolviam por mim. Nunca sofri por amor; terminava relacionamentos da mesma maneira que perguntava as horas a algum transeunte. A única dor passional que sentia era a dos tapas das garotas que dispensava, nada que algumas cervejas não anestesiassem. 
Me formei, e vi muitos amigos casarem. Nunca me via em seus lugares, com as mãos frias e suadas ao esperar pela mulher de minha vida no altar. Não acreditava no amor, apenas na conveniência de ter alguém em quem se apoiar. 
Engraçado como a vida pode mudar em um minuto. 

Flashback – três anos atrás 

- Bom dia. Meu nome é Niall Horan e eu serei seu professor de biologia laboratório esse ano. 
Sorri cordialmente ao receber um uníssono bom dia como resposta, respirando fundo ao analisar os cerca de trinta pares de olhos curiosos que me encaravam. 
Mais um ano começara. A revigorante sensação de ensinar para alunos que nunca haviam tido uma aula sequer comigo, sempre bem-vinda, se espalhava por meu corpo conforme eu circundava minha mesa, sentando-me sobre a madeira de maneira informal. 
- Como hoje é nossa primeira aula, não faremos muito mais que a introdução às regras do laboratório e apresentação dos aparelhos que nos ajudarão em nossos relatórios – continuei, cruzando os braços sobre o peito – Porém, não se deixem enganar; o que veremos nos próximos minutos será de extrema importância para a praticidade e segurança do resto de nossas aulas. Portanto, muita atenção. 
Alguns alunos sacaram cadernetas e canetas, prontos para anotar todas as minhas palavras. Típico. 
- Vamos começar pelas regras. Como faremos vários experimentos envolvendo produtos químicos que podem ser perigosos caso entrem em contato com a pele ou manchar as roupas, o uso do avental é imprescindível. 
Indiquei o jaleco branco que usava, e aguardei até que os alunos que anotavam minhas instruções descansassem novamente as canetas sobre a mesa. Prossegui com minhas recomendações e em cerca de vinte minutos todas as informações necessárias já haviam sido transmitidas. Anotei alguns detalhes extras no quadro após distribuir uma folha com o desenho de um microscópio e as indicações de todos os nomes das partes que o compunham para uso futuro. 
- Por hoje é só... Na próxima aula começaremos a observar células humanas no microscópio, complementando a aula teórica de introdução à citologia. Alguma dúvida? Como de costume, intimidados pelo primeiro contato, ninguém ergueu a mão. Dei de ombros. 
- Tudo bem, sintam-se à vontade para perguntar caso tenham dúvidas posteriores – sorri, sentando-me em minha cadeira - O sinal deve tocar daqui a dez minutos, então prossigam com suas anotações. Ah, e antes que eu me esqueça, um conselho: se eu fosse vocês, escovaria bem os dentes antes de nossa próxima aula. Afinal, nunca se sabe quando se terá que fazer raspagem bucal para observação em microscópio. 
Alguns risos tímidos preencheram o laboratório, e eu mesmo ri de minha indireta, fazendo algumas anotações em minha caderneta. Suspirei baixo, largando a caneta e observando o comportamento sempre divertido dos novatos com leve interesse, até meus olhos encontrarem algo que seria cômico, se não fosse trágico. 
Uma garota, com os cabelos firmemente presos num coque, lutava para dobrar as mangas de seu jaleco, que insistiam em desobedecê-la e voltar a cobrir suas mãos. 
Comprimi meus lábios, sufocando um risinho, e continuei olhando até que ela bufou, com um leve tom avermelhado no rosto, fazendo com que uma mecha solta de sua franja voasse repentinamente e caíssem com leveza sobre seus olhos. Não resisti. 
- Espera – murmurei, aproximando-me em poucos segundos e dobrando habilmente suas mangas – Pronto. 
As palavras me soaram familiares por algum motivo, mas ignorei o pensamento naquele instante. A garota me olhou por alguns segundos, surpresa com minha ajuda inesperada, e o rubor em suas bochechas intensificou-se. Olhando em volta discretamente, perguntando-se se o resto da turma havia percebido a atenção especial e notando que os alunos pareciam mais interessados em suas próprias conversas, ela sorriu fraco, baixando os olhos para seus pulsos visíveis. 
- Obrigada – sua voz baixa disse, e eu libertei meu riso curto ao vê-la me olhar com certa vergonha – Acho que esse avental é um pouco... Grande. 
- Percebi – comentei, erguendo as sobrancelhas por um instante – Não precisava usá-lo hoje, só começaremos a mexer com material de laboratório na semana que vem. 
Ela piscou algumas vezes, parecendo desapontada, e por algum motivo minha voz agiu independentemente. 
- Mas tudo bem. Você seguiu o procedimento desde a primeira aula. Deve ser uma aluna dedicada. 
Seus olhos, antes um tanto baixos, voltaram a fitar os meus, e um sorriso que parecia ter luz própria surgiu em seu rosto. Engoli em seco. 
Um gancho invisível pareceu me puxar pelo estômago, e por um segundo eu não estava mais no laboratório. 
Eu estava na varanda dos Davies, brincando com Lucy. 
Senti a cor deixar meu rosto gradativamente. 
- Eu realmente adoro biologia – a garota disse com confiança na voz, despertando-me de minha viagem ao tempo – Talvez porque meu pai é médico e sempre me ensina uma coisa ou outra sobre o assunto. 
Assenti, sem conseguir tirar os olhos dela, que agora parecia mais à vontade com minha presença. Meu coração batia forte, e eu tive medo de deixar transparecer algum tipo de emoção indesejada. 
- Como é o seu nome? – gaguejei, considerando a hipótese de seu sobrenome ser familiar; não que a fisionomia fosse parecida, mas algo nela trazia de volta algumas lembranças que eu tomei o cuidado de manter distantes há alguns anos. 
- (S/N) (Seu sobrenome) – ela respondeu prontamente, as pontas de seus lábios curvadas num sorriso. Imitei sua expressão, um tanto frustrado com a resposta nada esclarecedora. 
- Muito bem, (Seu sobrenome)... Veremos se seu rendimento em minhas aulas será mesmo tão promissor quanto parece – falei, lançando-lhe um sorriso encorajador ao me afastar, retornando à minha mesa. De lá, tentando me recompor da repentina visita ao passado, observei-a sorrir para si mesma, anotando furiosamente algo em seu caderno, antes de o sinal tocar, liberando a turma de mais um dia letivo. 
(S/N) (Seu sobrenome)... Definitivamente, um nome do qual eu deveria me lembrar. 

Fim do flashback 

Me peguei sorrindo ao voltar ao presente. Ela sempre fora adorável aos meus olhos. 
Não comecei a me empenhar tanto em chamar sua atenção tão repentinamente; o primeiro ano foi apenas de observação, as reviravoltas em minha mente buscando sua origem em cada detalhe, sem encontrar respostas. 
Dizer que desisti de entender não seria de todo verdade. Vez ou outra, quando ela adormecia em minha cama, as dúvidas voltavam a formigar em minha mente sonolenta, mas não se demoravam. Tudo que importava era o momento, e a vivacidade com a qual meus sentidos percebiam o corpo dela ao lado do meu.
Virei a dose de whisky em um único gole, espantando as memórias e voltando a me focar no presente. Meus olhos pairaram sobre a mesa de centro, mais especificamente no brilho metálico das chaves do carro, e tirando coragem do álcool ainda queimando em minha garganta, fiquei de pé novamente, pegando-as antes de seguir rumo ao elevador. 
Como alguém me ensinara há muitos anos, certas coisas na vida devem ser feitas como retirar Band-Aids: rapidamente para evitar prolongar a dor. 
No fundo, eu sabia que não seria exatamente o caso. 



CONTINUA...

9 comentários:

  1. Ficou perfeitoooooooo .continua logo, pf

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  2. Ooh Deuses do olimpo, ta perfeita, vc tem continuar logo *--*

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  3. Você divulga?? Divulga pra mim por favor!!

    http://loucas-poronedirection.blogspot.com.br/

    Agradeço muito!!

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  4. posta logooooo é minha fanfic favorita, tem como me mandar o link da biology 2 no fanfic obsession

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    1. aki o link que vc me pediu :3 :)) https://www.google.com.br/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd=1&cad=rja&ved=0CC0QFjAA&url=http%3A%2F%2Ffanficobsession.com.br%2Ffanfics%2Fb%2Fbiology2.html&ei=PLeTUtTnK4WskAeEmoCYCw&usg=AFQjCNHUxtVUV-gC8rG0pl_aHoAIn9aIxA&sig2=hKSaoIZoIsx81jf3vyeeFg

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  5. meeu deus que perfect,essa menina e azarada em meu deus 1° o harry tinha uma noiva 2° o niall tem um filho jesus o que mais falta,ela precisa procurar um pai de santo ou algo do tipo pra tirar essa macumba dela!to amando comtinuaa.

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    1. kkkkkkkk verdade, e ainda vai acontecer mta coisa com ela ao longo dessa fic tenho até pena dela coitada kkk

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  6. Nossa vei,eu imitei o Niall de verdade ,quando ele viu a Lucy morrer,eu chorei muito,(eu sou muito fraca pra essas coisas), me acalmei. tudo que ele fazia eu fazia.!

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